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O Parlamento dos Jovens: participação política e cívica ativa

“É desde 2006, que o Programa existe no formato atual, que se desenvolve ao longo de todo o ano letivo.”

Ana Rita Laranjeira é licenciada em Psicologia e coordenadora do Programa ‘Parlamento dos Jovens’ desenvolvido pela Assembleia da República.

Como nasceu a iniciativa da Assembleia da República Portuguesa ‘Parlamento dos Jovens’?

O programa nasce de uma ideia e da vontade da então Deputada Julieta Sampaio em 1995. O objetivo era recriar uma sessão parlamentar, dando a oportunidade a um grupo de cerca de 80 jovens de debaterem os Direitos da Criança. A vontade de abrir as portas da Assembleia da República, que era uma novidade até então, permitiu convidar os jovens a participar enquanto jovens deputados e debater um tema que se entendia de toda a relevância e interesse. Na altura chamava-se ‘O Parlamento das Crianças’ e foi o pontapé de saída para o programa.

Nos anos seguintes, esta iniciativa acabou por se repetir, mas ainda numa lógica de uma iniciativa anual, abrindo as portas para receber um grupo de jovens para debater um determinado tema. Rapidamente se percebeu, quer da parte da comunidade educativa, quer da parte da Assembleia da República, que havia um interesse comum de institucionalizar este tipo de iniciativas e, em 1998, foi estabelecido o primeiro protocolo entre a Assembleia da República e o Ministério da Educação para formalizar este compromisso comum, na altura ainda apenas dirigido aos jovens dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico.

A iniciativa foi ganhando maturidade ao longo do tempo, a par de outras que existiam na altura, dirigidas ao ensino secundário, nomeadamente a ‘Assembleia na escola’ e, no âmbito do então Instituto Português da Juventude, o ‘Hemiciclo, jogo da cidadania’, com participação cívica e política dos jovens. É, finalmente, em 2006, com a fusão das várias iniciativas, que é criado o Programa ’Parlamento dos Jovens’, na Assembleia da República, em estreita colaboração e parceria com o Ministério da Educação, a Secretaria de Estado da Juventude e Desporto, a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas e as secretarias regionais que tutelam a educação e a juventude nos Açores e na Madeira.

É desde 2006, que o Programa existe no formato atual, que se desenvolve ao longo de todo o ano letivo.

Sessão nacional do parlamento dos Jovens – Ensino Secundário. 30 de maio 2023. 09H30. Palácio de São Bento.

Qual a recetividade da comunidade educativa nacional a esta iniciativa?

A perceção que temos, logo pelo número de inscrições, é que, de facto, há um grande compromisso da comunidade escolar para aderir a este tipo de iniciativas, e há também um reconhecimento do valor do Programa e do que acrescenta. Os professores são, sem dúvida, os grandes impulsionadores do sucesso do Programa. É deles que parte a iniciativa da inscrição e também o grande encargo de manter o Programa a funcionar nas primeiras fases, de mobilizar a Direção das escolas e, depois, os jovens, envolvendo-os no debate de um tema, que é definido anualmente.

Para além do número de inscrições – que na edição passada atingiu um novo recorde -, destacamos o universo dos 390 mil jovens das escolas inscritas no Programa: tivemos cerca de 215 mil votantes, que participaram no processo eleitoral da sua escola.

Muitas vezes, acabamos por dar visibilidade aos jovens que são eleitos, aqueles que se organizam em listas, que participam no processo enquanto agentes ativos, mas a verdade é que temos também o outro lado, o dos jovens que votam, participam nas tertúlias, nos debates e, apesar de não serem eles próprios os representantes da sua escola e do seu distrito, as suas ideias estão lá, estão vertidas nos documentos que daí resultam e, portanto, a vivência do Programa tem esta amplitude de representar o pensamento coletivo que nasce nas escolas e que vai sendo construído ao longo das várias etapas do Programa.

Como é que esta iniciativa promove, na prática, a participação cívica e política dos jovens portugueses?

O Programa desenvolve-se em várias fases, ao longo do ano letivo, que são semelhantes para as sessões do ensino básico e do ensino secundário: a 1.ª fase com Sessões Escolares; a 2.ª fase com Sessões Distritais/Regionais; e a 3.ª fase com Sessões Nacionais. Na 1.ª fase, as escolas inscritas iniciam o processo eleitoral, construído em torno do debate de um tema definido anualmente, em que se inclui a formação de listas candidatas à eleição de deputados, a campanha e o ato eleitoral, culminando na Sessão Escolar com a aprovação do Projeto de Recomendação da escola e a eleição dos respetivos representantes às Sessões a nível distrital ou regional. Nas Sessões Distritais/Regionais, reúnem-se os deputados que representam as escolas de cada distrito ou região autónoma, para aprovar os Projetos de Recomendação a submeter à Sessão Nacional do Parlamento dos Jovens e eleger os deputados que vão representá-los na Assembleia da República. Finalmente, é nas Sessões Nacionais que se reúnem os deputados das escolas eleitas nas Sessões Distritais/Regionais para aprovar, após debate em reuniões de Comissão e em Plenário, as Recomendações finais sobre o tema de cada edição do Parlamento dos Jovens (uma relativa à sessão do ensino básico e outra à do secundário).

Sessão Nacional do Parlamento dos Jovens – Ensino Básico 09/05/2023 Palácio de São Bento
Sessão nacional do parlamento dos Jovens – Ensino Secundário. 30 de maio 2023. 09H30. Palácio de São Bento.

No final de cada edição do Parlamento dos Jovens, as recomendações aprovadas pelos jovens deputados são apreciadas pela Comissão com competência na área da Educação – atualmente, a Comissão de Educação e Ciência e as medidas tomadas pelo Governo e pelos Grupos Parlamentares no seu âmbito são anualmente publicadas na página de Internet do Parlamento dos Jovens.

Esta estrutura tripartida em fases confere uma lógica de continuidade, de um processo que é construído ao longo de todo o ano letivo, que faz com que haja compromisso e envolvimento alargado e continuado de todos. As fases sucedem-se, há sempre trabalho a fazer; a participação dos jovens no Programa é o mais alargada possível. O Programa não se esgota nos jovens que se candidatam a serem representantes da escola, nem tão pouco naqueles que chegam às Sessões Nacionais. O Programa faz-se e tem impacto em todos aqueles que ajudam a construir este processo, os jovens que estão nas mesas, os que participam na comissão eleitoral escolar, que coordena todo o processo eleitoral, e que acabam por não ter uma identidade nas fotos que vamos partilhando porque não estão presentes nas sessões nacionais mas todos eles, de alguma maneira, concretizam aqueles que são os objetivos do Programa.

E o que é isto de ter uma participação política e cívica ativa? É cada jovem ter uma palavra a dizer sobre o tema que está em debate e, no final de cada edição, poder rever-se nas recomendações finais aprovadas nas sessões nacionais, poder lê-las e olhar para elas, sentindo-se representado.

Nesta fase, os jovens já estão bem cientes de qual é a vontade da maioria. Mesmo na eventualidade de não ser aquela a posição da sua escola, sabem que estão ali noutra qualidade, a de representar todos os jovens participantes no Parlamento dos Jovens. A defesa das nossas ideias é sempre mais fácil do que a defesa das ideias da maioria, quando não são coincidentes, mas é isso que é a democracia. Na verdade, um pouco da reflexão que foi feita em todas as escolas, com todos os participantes, está também vertida nessas recomendações que depois são entregues ao Senhor Presidente da Assembleia da República.

Da experiência com as escolas que já participaram nesta iniciativa ao longo dos anos, qual a sua perceção sobre os principais desafios que têm encontrado?

É um programa muito exigente. Esta lógica continuada acarreta um compromisso por parte dos professores que nem sempre é fácil de gerir. A compatibilização do calendário escolar/letivo com o calendário de atividades do Programa é sempre um desafio que reconhecemos que é de grande exigência. Por exemplo, isto é visível na figura do Professor Coordenador, que é quem coordena todas as atividades do Programa na escola, mas a sua atuação não é apenas numa determinada turma, é em toda a comunidade escolar e isto envolve conseguir o compromisso de toda a escola, o envolvimento de todas as turmas para que o Programa não se desenvolva apenas num nicho de interesse, de jovens que, porventura, até já possam estar mais despertos para estas questões. O objetivo é fazer isso também, mas fazer tudo o resto, e alcançar aqueles para os quais o Programa não tem ainda visibilidade, ou não tem interesse.

É também muito exigente a responsabilidade de reportar dados e de preencher formulários, o que consome muito tempo. Portanto, sabemos bem que quem está no Programa é porque está muito comprometido, porque este implica um grande esforço, mas é, seguramente, gratificante!

De que forma as escolas podem participar?

Desde logo, a partir da sua inscrição. A inscrição é feita pela escola, tem que ser a Direção da escola a assumir o compromisso de se inscrever no Programa.

Nesta 29.ª edição do Programa, que arrancou a 1 de setembro, acompanhamos, naturalmente, a celebração dos 50 anos do 25 de Abril e, portanto, temos um tema que é não apenas atual mas que vai ao encontro do que foram as propostas dos jovens – “Viver ABRIL na Educação: caminhos para uma escola plural e participativa”.

Os jovens fazem sempre propostas de temas para o ano seguinte e o que se destacou dessas propostas foi o tema da educação, um assunto que os jovens queriam ver debatido e que lhes permite identificar formas de reforçar os “caminhos para uma escola plural e participativa”.

Depois deste primeiro ato de compromisso e de vontade, ao estabelecerem a inscrição no Programa, a escola, através do seu Professor Coordenador, organiza um conjunto de atividades, seguindo as três fases do programa e o calendário de ações a desenvolver em cada edição.

E de que forma este programa conta com o envolvimento dos deputados da Assembleia da República?

O Programa prevê a participação de Deputados da Assembleia da República em todas as suas fases. Na primeira fase do Programa, temos um momento de debate com a participação de um Deputado da Assembleia da República. É uma ação opcional, mas as escolas que o desejarem, podem submeter um convite à Assembleia da República e, em regra, um Deputado vai à escola falar sobre o que é a Assembleia da República, em que consiste o mandato e o trabalho parlamentares, como se organiza uma sessão de trabalho, como se discutem e constroem as leis, mas também para aflorar o tema da edição, partilhando a experiência da construção de um processo legislativo sobre um determinado tema, que é isto que os jovens terão de fazer. O propósito da ida dos Deputados às escolas, passa pela partilha do processo de converter uma ideia numa medida, de a escrever, defender e apresentar, para além de falar sobre a instituição “Assembleia da República” e ajudar os jovens a construir o caminho proposto em cada edição. No momento das visitas durante a 1.ª fase do Programa, os jovens poderão estar em diferentes momentos do seu trabalho, dado que o calendário das ações da 1.ª fase é flexível e definido por cada escola. O debate na escola com um Deputado da Assembleia da República pode também ser impulsionador da organização da campanha ou da construção do programa eleitoral.

Já na fase das Sessões Distritais/Regionais, temos um período da agenda que é dedicado à participação dos Deputados da Assembleia da República, que é muito aberta e flexível. O Deputado disponibiliza-se para responder às questões dos jovens, sejam sobre temas da atualidade ou sobre o tema específico que está em debate.

Na Sessão Nacional, os Deputados participam em vários momentos. Desde logo nos trabalhos de Comissão. Estas reuniões são presididas por dois Deputados da Assembleia da República, que ajudam e orientam os trabalhos nesta fase. Na Sessão Plenária, à semelhança do que acontece nas sessões distritais, está prevista a participação dos Deputados representantes dos vários grupos parlamentares, a quem os jovens colocam questões. Nessa ocasião, a missão dos Deputados é a de responder às interpelações dos jovens.

Quase a celebrar trinta anos de Programa, é curioso destacar que temos, já, Deputados da Assembleia da República a partilhar com os jovens a sua própria experiência de participação enquanto deputados do Parlamento dos Jovens, o que também é um efeito da maturidade do Programa.

Mais informações disponíveis na página do Parlamento dos Jovens.

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