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Uma reflexão sobre a Educação como bem público

“Reconhecer, no entanto, que a escola se constitui, muito particularmente, como ambiente educativo, é incontornável.”

É inegável o reconhecimento de que a Educação é um direito. Está, como sabemos, plasmado num vasto conjunto de convenções, sendo disso exemplo o artigo 26º da Declaração Universal dos Direitos Humanos que refere que “todas as pessoas têm direito à educação” e reforça que a “educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos humanos e das liberdades fundamentais [, devendo] promover a compreensão, tolerância e amizade entre as nações, grupos religiosos ou raciais”. O compromisso coletivo de materializar estas (e tantas outras) missões que corporizam o direito à educação é, sem dúvida, exigente e não se circunscreve ao espaço da escola. Pelo contrário, o espaço da educação é transversal à sociedade e permeado por uma diversidade de instituições, públicas e privadas, com imenso potencial na coconstrução deste direito universal.

Reconhecer, no entanto, que a escola se constitui, muito particularmente, como ambiente educativo, é incontornável. O seu papel destaca-se, não apenas pela ligação ao ensino, à aprendizagem e ao desenvolvimento integral dos indivíduos, mas pelo seu potencial para fomentar lógicas de resistência à hegemonia e à supremacia de um ideal-único (de aluno, de saber, de experiência, etc.), fazendo isto supor disponibilidade para reinventar modos de pensar e de fazer educação (Nóvoa, 2009). Ou seja, se, por um lado, a educação atravessa e é ela própria atravessada por temas variados, dos mais consensuais aos mais controversos; por outro lado, é o exercício de estar em contexto que permite que os conheçamos e questionemos em liberdade, consciência e de forma informada.

Assim, importa, nas agendas da escola, muito além da sua dimensão conteudística, o contexto em que surgem, as que se privilegiam, por quem e de que forma. Significa que este espaço, de desejável diálogo e troca, tende a não emergir per si; pelo contrário, espera-se que seja intencionalmente construído e preveja o envolvimento de pessoas várias, com vivências, origens, preferências, saberes, condições físicas, sócio económicas, etc. diversas. Não raras vezes, essa diversidade implica adotar abordagens “diferentemente iguais” (Stainton, 2005) e ensaiar respostas sociais e pedagógicas alternativas, ainda que não menos rigorosas. Reconhece-se, também por isso, que é tanto ou mais desafiante quanto rico este processo de perspetivar a educação de forma democrática e a participação no sentido amplo, horizontal, antecipando a diversidade dentro da diversidade (Menezes, 2007; Tricket, 2009).

Deste modo, seguindo a linha de Dewey (2004), entender o sentido educativo da escola requer que tomemos a experiência como ingrediente da aprendizagem e a vivência com outros/as como matéria-prima da integração, do respeito e do bem-estar. Implica, por conseguinte, reforçar que o direito à educação também se concretiza quando as oportunidades de real participação acontecem e aqueles/as que menos se envolvem, podem e devem ser convocados/as a partilhar as suas leituras do mundo e da escola. Sublinha-se, a este respeito, a ideia de que serem envolvidos/as não apenas a identificar problemas, mas a propor soluções, permite que re/signifiquem as suas aprendizagens como resultado da experiência coletiva e ativa. É, finalmente, a oportunidade de acolher dissensos mais do que convergências, onde importam valores generalizadamente humanistas, que (também) dota a escola de potencial para concretizar a educação como um bem público.

Sofia C. Pais | Professora auxiliar no Departamento de Ciências da Educação da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto e investigadora do Centro de Investigação e Intervenção Educativas. Na sua investigação, privilegia o diálogo entre educação, direitos, saúde e bem-estar, e intervenção comunitária.

Referências
Dewey, John (2004). Experiencia y educación. Madrid: Biblioteca Nueva.
Menezes, Isabel (2007). Intervenção comunitária: Uma perspectiva psicológica. Porto: LivrPsic.
Nóvoa, António (2009). Educação 2021: para uma história do futuro. Revista Iberoamericana de Educación 49, 181-199.
Stainton, Tim (2005). Empowerment and the architecture of rights based social policy. Journal of Intellectual Disabilities 9, 289-298.
Tricket, Edison J. (2009). Community psychology: Individuals and interventions in community contexts. Annual Review of Psychology, 60, 395-419.

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